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Construção de uma canoa de madeira - 1a parte - casco


Uma vez terminada a construção do caiaque oceânico de madeira, e tendo como pano de fundo prazer que foi realizar esse projeto, comecei a pensar em qual seria o próximo desafio. Baseado nas experiências de viagens e remadas anteriores, pareceu-me natural que fosse a construção de uma canoa, e comecei uma análise dos projetos disponíveis no mundo.


Escolha do modelo

Quando se precisa escolher uma canoa, se quer um pouco de tudo (aliás, como em qualquer decisão...). Creio que o melhor ponto para começar é tentar definir o uso que se quer fazer.

No meu caso, com certeza não quero uma canoa para águas brancas (rafting). O uso será principalmente para rios mais bem comportados, e pequenas, médias e grandes viagens (1 dia, final de semana e mínimo de 1 quinzena de dias, respectivamente).

Portanto a questão da manobrabilidade não é tão importante. Apenas o necessário para vencer as curvas de rios, mais ou menos estreitos. E, apesar de ter um grau de manobrabilidade confortável, conseguir, ao mesmo tempo, ter um bom desempenho em manter a direção, sem necessidade de constantes correções. No entanto, a questão do desempenho hidrodinâmico torna-se importante, já que, sobretudo para grandes viagens, a eficiência é um aspecto de conforto, no mínimo.

Esses requisitos definem um casco com pouco “rock”, ou seja, com pouco abaulamento no sentido longitudinal. Também, por uma questão de eficiência hidrodinâmica e tendo em vista o uso para longas viagens,  se impõe um comprimento de pelo menos 5 m. Em outro post, mencionarei a questão de eficiência hidrodinâmica e comprimento da embarcação.

Portanto uma canoa de pelo menos 5 m atende aos requisitos de ter um bom desempenho hidrodinâmico e ser adequada para longas viagens (o que significa capacidade de carga).

Uma canoa solo, ou seja, remada sempre por um só remador, tem uma largura de boca menor do que uma canoa tandem (para, pelo menos 2 remadores) e eficiência maior. No entanto limita seu uso para viagens de um dia ou fim de semana, já que, nessas circunstâncias, em geral, se está acompanhado.

Após uma exaustiva análise dos planos disponíveis na Internet, decidi-me por uma canoa desenhado por Steve Killing (http://www.stevekilling.com/).

Uma particularidade que me atraiu neste projeto é o fato da canoa ter o casco assimétrico. Ou seja, a parte mais larga da canoa não está no meio do comprimento, mas um pouco para trás. Isso, em princípio, favorece o desempenho. De toda maneira gostei desse projeto e decidi construí-lo. No fim, as decisões serão sempre feitas na base do “porque sim” ou do “porque gostei”.
  
Processo de construção

O processo de construção é similar ao do caiaque, ou seja, por strip building. A grande diferença é que há somente o casco para se construir. Não há o deck do caiaque, que toma um grande tempo de construção. Portanto a expectativa é de que o processo todo seja bem mais rápido.

Com relação ao tempo de construção, tanto na canoa quanto no caiaque é um dado muito relativo. Afinal a construção é feita aos poucos, no final de alguns dias, às vezes ao longo de um fim de semana mais chuvoso... Difícil dizer. A construção da canoa, sem muita urgência, me tomou um ano.

Madeira

Decidi construir a canoa em caixeta, com detalhes em cedro, que seria o inverso do feito no caiaque de madeira (ver post respectivo). Como as curvaturas do casco de uma canoa são menores do que as de um caiaque (casco ou deck), preferi utilizar ripas de mesma espessura (6 mm), mas de largura maior (19 mm). Todas as ripas foram usinadas com perfil côncavo-convexo, como no caso do caiaque.

A estrutura sobre a qual o casco será construído

A primeira coisa a fazer é construir uma viga sobre a qual as cavernas serão posicionadas. Utilizei a mesma coluna usada na construção do caiaque, com pequenas adaptações. Sobre essa viga, posicionei as cavernas. Estas precisam estar alinhadas longitudinalmente, transversalmente e perpendicularmente. Ou seja, todas as cavernas precisam estar a 90º em relação à viga, tanto no sentido vertical quanto transversal. Além do clássico nível de bolha (de pedreiro), também é bem útil os modernos níveis a laser. Uma vez todas as cavernas alinhadas e fixadas, pode-se iniciar a colocação das ripinhas de madeira.



Moldagem dos perfis de proa e popa

Para terminar o esqueleto sobre o qual será construído o casco, é preciso confeccionar os moldes de proa e popa. São estruturas curvas sobre as quais todas as ripas que formam o casco terminam e são fixadas. Esses moldes são laminados com lâminas de madeiras de 3 mm de espessura cada.  São 3 lâminas para a parte interna e mais 3 para a parte externa (a ser colada externamente ao casco, uma vez pronto, para aumentar a rigidez). Como as lâminas terão de ser curvadas, recomenda-se mergulhar o conjunto de lâminas em água quente  para então colocá-las no molde de madeira e deixá-las secar no molde. Secas, as lâminas conservam razoavelmente o formato curvo e facilitaram o processo de colagem. Deve-se colar as lâminas com cola feita de epóxi (mistura de resina epóxi com pó de serragem) e deixar curar na forma. Depois, fixar os moldes na forma com grampo de tapeceiro e alinhar no esqueleto.   


Construção do casco

A primeira ripa a ser colocada é a da borda, em cada lado. Coloquei a primeira com o lado convexo para cima, para facilitar a aplicação de cola. A seqüência de colagem passa a ser: aplicação de cola sobre o bojo convexo, encaixe da próxima ripa, fixação com grampo de tapeceiro em cada caverna; e assim por diante. Foram colocadas 3 ripas de cada lado por vez. O processo todo é rápido. O que dificulta são as emendas de ripas, no caso do tamanho não ser suficiente para o comprimento do barco. Neste caso, aconselho a usar emendas em ângulo de 45º ou próximo (não usar emendas de topo, a 90º). Dá um pouco de trabalho, mas facilita muito usar uma forma de corte.



Também é necessário acertar a finalização de cada ripa nos terminais de popa e proa. Lembrar que tanto o perfil de proa quanto de popa poderão ser revestidos depois com uma lâmina de madeira, para acabamento.



O processo de colagem das ripas se repete até o fechamento do casco. Após, retira-se todos os grampos com um alicate e passa-se ao processo de acabamento de pequenos vãos e lixamento para deixar toda a superfície lisa e pronta para a fase de resinagem.
Também se coloca o reforço externo na proa e na popa, lixando posteriomente. 


Cananeia - Guaraqueçaba - Superagui

Cananeia - Guaraqueçaba - Cananeia


Um bate e volta ao restaurante do Barbosa
 07 a 10 de Julho de 2005


O Complexo Estuarino-Lagunar do Lagamar compreende uma faixa de aproximadamente 510km de costa, indo do litoral Sul de São Paulo (região de Iguape/Cananeia) ao litoral Norte do estado do Paraná (região de Guaraqueçaba-Paranguá).

O Lagamar contém uma variedade de ecossistemas tais como mangues, rios, estuários, praias, costões rochosos, planícies litorâneas, montanhas, e a Mata Atlântica permeando tudo isto. 
Esta área abriga espécies ameaçadas de extinção tais como o papagaio de cabeça roxa, o mico-leão caiçara (Leontopithecus caissara), veado-mateiro, mono-carvoeiro, lontra e jacaré-de-papo-amarelo.

O Parque Estadual da Ilha do Cardoso, e o Parque Nacional do Superagui, ao sul do Complexo Lagamar, foram declarados Reserva da Biosfera pela Unesco.  A ilha do Superagui é na verdade artificial, já que o canal do Varadouro foi aberto em 1953.Toda esta riqueza de fauna e flora se estende, talvez de uma maneira ainda mais acentuada, ao ecossistema aquático. Centrado nos manguezais, a mistura de mar e rio propicia uma riquíssima vida aquática, sendo um dos maiores viveiros de peixes e crustáceos do Atlântico Sul.








A remada foi uma ida e volta entre Cananeia e Guarequeçaba. Mas também é possível partir de Ariri, no Canal do Varadouro, o que encurta bastante o caminho. A vila de Ariri é um bom ponto de partida para explorar a região, já que está próxima da Ilha do Cardoso, Ilha do Superagui e baía dos Pinheiros ao sul.


A remada foi uma ida e volta entre Cananeia, onde deixamos o carro, e Guarequeçaba, na baía de Paranaguá. Mas um ponto muito interessante de entrada para explorar toda essa região da Ilha do Cardoso, Ilha do Superagui e baía dos Pinheiros, é a vila de Iriri, no canal do Varadouro.







A viagem foi realizada em dois caiaques oceânicos, pilotados por Linilson  e Renato. A distância percorrida entre Cananeia e Guarequeçaba somou no total 177 km. Essa distância foi percorrida numa mistura de remada e carona (tão improvável quanto inesperada...).


07/07/2005. A saída de Cananeia foi às 8:30hs.  A "perna" de ida até Guarequeçaba foi realizada remando até a boca do canal de Ararapira, que separa a Ilha do Cardoso do continente e daí até a baía de Paranaguá, de carona em uma traineira de pesca, conforme relatado em mais detalhe no diário de bordo. Quando estávamos entrando no canal de Ararapira uma traineira de pesca, "perdida" nos perguntou qual era a entrada do canal. Eles estavam querendo ir para Paranaguá, por dentro, já que o mar estava muito encrespado. Quando viram que estava com mapa e GPS, o capitão nos convidou para ir com eles. Aceitamos na hora, amarramos os caiaques para serem rebocados, e pulamos para bordo. Foi uma ótima oportunidade para conhecer um pouco a rotina de trabalho desses pescadores. Às 18:30hs deste mesmo dia eles nos deixaram próximo da comunidade de pescadores de Guapicum, na Ilha das Peças, a 12 km de Guarequeçaba, onde pernoitamos.


08/07/2005. Aguardamos a subida da maré até as 10:30 hs para poder passar os baixios e seguir para Guarequeçaba, onde chegamos às 12:30hs. Almoçamos no restaurante do Barbosa, conhecido tanto pela boa comida como por estar bem em frente ao porto. 


Às 13:30s iniciamos o caminho e volta. Utilizamos um furo que leva direto para a Baía dos Pinheiros, economizando uns 10 km de remada. Esse furo possui várias saídas falsas e becos sem saída, o que não representa necessariamente um problema. Como é utilizado usualmente pelos caiçaras, frequentemente há embarcações passando por ele. Em caso de dúvida sobre o caminho a seguir é só aguardar a passagem de alguém.
Dormimos na comunidade de caiçaras de Cebuí, na Baía dos Pinheiros, tendo percorrido 19 km desde Guarequeçaba.



10/7/2005. Partimos às 7:30 horas com destino a Cananéia. Remar pelo canal de Ararapira, atrás do ilha do Cardoso é uma maravilha. Nessa época não há mosquitos nem voadeiras de pescadores e tudo é muito tranquilo além de muito bonito. O canal é cercado pelas montanhas do continente e da Ilha. Existem vários riachos da Ilha que deságuam no canal. Navegação tranquila até a Baía do Trapandé. Esse trecho entre a entrada do canal até Cananeia é sempre difícil, pois sempre haverá um trecho com maré contra. Devido à proximidade da Barra de Cananeia a correnteza de maré vazante ou enchente é bem forte. Chegamos às 13:00hs em Cananeia, tendo remado 35 km desde Marujá e 85 km desde Guarequeçaba.


De uma maneira geral, uma viagem entre Cananeia e Guarequeçaba, ida e volta (170km), pode ser feita em 4 dias remando sem correrias, mesmo tendo as inevitáveis marés contra pelo caminho. Na época de inverno, as temperaturas são agradáveis mesmo durante a noite. Não há mosquitos e o trânsito de voadeiras de pescadores (que chegam a incomodar na temporada) é mínimo. Existe a possibilidade de se acampar em vilas e comunidades de caiçaras ao longo do caminho todo. Aliás, devido ao mangue, esses são praticamente os únicos lugares onde isso é possível. Mesmo lugares para uma "esticada de pernas" são raros. Andar pelo mangue na maré baixa é arriscar-se a atolar até os joelhos.





Rios Itaguaré e Guaratuba (Bertioga, SP)

Rios próximos de Bertioga e mais ainda da Riviera de São Lourenço. Trata-se de um rios, na sua maior parte, de mangue, onde a maré tem uma influência determinante. Na sua parte próxima à estrada Rio-Santos a diferença do aspecto do rio entre a maré baixa e a alta é enorme, e essa influência se estende, em menor grau a uma dezena de quilômetros adentro. Alguns trechos do esquema abaixo só são possíveis de serem percorridos em maré cheia.

Tanto o Itaguaré quanto o Guaratuba se encontram a hora e meia de São Paulo, e depois de algumas remadas no rio tem-se a impressão de se estar a milhares de quilômetros da cidade mais próxima. Percorrendo ambos os rio, pode-se passar de uma paisagem de mangue, a uma de restinga e finalmente a mata Atlântica. As distâncias nos esquemas são datas entre os pontos amarelos. Um bom ponto de entrada e saída é o bar/restaurante ao lado da ponte.
Os esquemas ilustram todo o complexo do rio Itaguaré e do Guaratuba com suas ramificações. Os trechos assinalados como cristalinos se referem a regiões próximos das encostas da Serra do Mar, onde os rios tornam-se cristalinos com fundos de areia, típicos dos rios que descem da Serra. A profundidade desses rios diminui, assim como a correnteza aumenta, conforme se avança por eles. Na volta pode-se ainda dar uma esticada até a foz, e curtir uma praia.
Cada um dos dois rios pode ser percorrido em um dia. A dica é usar os trechos cristalinos para paradas mais longas, bem como bons banhos de rio. Nos meses mais quentes ao longo de todo o rio ter-se-á a companhia desagradável de mutucas, que encaram repelentes como aperitivos. A dica é ir vestido de calças e camisas de mangas compridas.


Ver abaixo mapas e fotos dos rios.


RIO ITAGUARÉ




 

RIO GUARATUBA







 



Rios Itapanhaú, Itatinga e Jaguaregua (Bertioga, SP)


O Rio Itapanhaú é o principal rio do litoral norte e proporciona belos passeios, por trechos de manguezais e mata atlântica, tendo como pano de fundo a Serra do Mar. O Itapanhaú vem do planalto, margeando a estrada Mogi-Bertioga, formando as belas cachoeiras que se pode ver da estrada.
São possíveis vários roteiros nessa região. Menciono três. O primeiro seria percorrê-lo em toda sua extensão na planície costeira.  O ponto de entrada é logo quando a estrada Mogi-Bertioga chega na planície. A partir dali, P0 no mapa, até a foz, no porto de Bertioga são 37 km. Um dia bem remado. No trecho inicial o rio passa por uma região de Mata Atlântica, passando aos poucos para o manguezal, que forma a maior parte da vegetação.  Por sofrer influência da maré, é conveniente programar o passeio para e pegar a maré a favor, facilitando um pouco a remada no trecho final .

Um segundo roteiro é explorar o rio Itatinga. Um ponto de entrada (e de saída) é o P2, antiga fábrica de palmito (acesso para Palmares, na Rio Santos). Deste ponto até a vila são uns 10 km. Outro ponto de entrada (e saída) é o P3 (entrar um pouco antes da entrada de Bertioga, sentido Santos Bertioga, à esquerda, no posto BR e seguir até o fim). A distância P2 - P3 é de 6 km. Região belíssima! A vila e a usina de Itatinga, construída na primeira década do séc. XX para abastecer o porto de Santos, valem a visita (mas é preciso autorização - informar-se nas agências de turismo de Bertioga).

Um terceiro roteiro é explorar o rio Jaguareguava. Um ponto de entrada (e saída) é o Porto de Itatinga (P3). Remada curta, já que do ponto P3 e entrando no Jaguareguava rema-se uns 5 km em média. A partir de um certo ponto (que depende da maré) ou a correnteza do rio torna a remada difícil. A melhor opção é amarrar o barco e seguir andando, pelo leito do rio. Tomar cuidado o cuidado de amarrar o barco! pois a maré pode mudar e o que era uma bela praia torna-se rio em pouco tempo.
É uma ótima opção para um passeio de fim de semana. Já estive lá diversas vezes na última década, sozinho, com minha mulher e com grupos de amigos e é sempre um prazer encontrar esses lugares tão perto de São Paulo.

















o que é água e o que é céu?